"Programas destes são absolutamente irrepetíveis. E essa
Rádio que, no início dos oitenta, mais ninguém fazia assim, também é
completamente irrecuperável. Nada a fazer."
"São realmente textos tão surpreendentes que ainda hoje vivem
por si, como se fossem fulgurantes retratos de fantasia e permanecem como
então, à frente do tempo dos próprios fotógrafos… "
José Nuno Martins
O
ANO DE 1980 VISTO PELO JORNAL EXPRESSO
Um
país inteiro, ainda à procura de rumo, entretém-se a dar voltas ao cubo de
faces coloridas inventado pelo húngaro Rubik. Há uma solução correcta entre
43,2 quinquilhões de possibilidades...
A
cores é agora a TV, que passa Dallas («quem matou J.R.?»).
Em
concertos de música brasileira nunca houve tanta fartura: Milton Nascimento,
Chico Buarque, Simone na Festa do «Avante!».
Na
Rádio Comercial há Pão com manteiga (Carlos Cruz), Lugar ao sul (Rafael
Correia) e Café concerto (Maria José Mauperrin).
Rui
Veloso funda o rock com Chico Fininho e Marco Paulo confessa-se (Eu tenho dois
amores). Victor Espadinha ainda fala aos corações (Recordar é viver) e as Doce
fazem sucesso (Amanhã de manhã). Eternos são Amália (Gostava de ser quem era) e
John Lennon (Woman). Babooska (Kate Bush) e Enola Gay (OMD) são outros sons que
andam no ouvido.
Já
chegou o CD, mas ainda em fita vemos Apocalypse Now, Kramer contra Kramer, A
Sombra do Guerreiro e Manhã Submersa.
E
Com um brilhozinho nos olhos (Sérgio Godinho) lemos O Nome da Rosa (Umberto
Eco).
Equipa
Inicial: Carlos Cruz, José Duarte, Mário Zambujal, Orlando Neves, Bernardo
Brito e Cunha, Eduarda Ferreira;
Que
viria depois a ser renovada para as segunda e terceira épocas: Carlos
Cruz, José Duarte, Mário Zambujal, Artur Couto e Santos, Clara Pinto Correia,
Luis Macieira, José Fanha e João Miguel Silva.
“Foi
o programa que abriu o caminho para as modernas formas de humor a que hoje
somos por cá expostos, embora me permitam que eu diga que era tão “à frente”
que ainda não se chegou aquele nivel outra vez, mesmo que haja humor muito bom
por aí à solta, e moderno.
Tinha influências da Mad, dos Monty Python e foi um brilhante
exercício de liberdade. Porque o humor antes do 25 de Abril não era assim, e
este era espantosamente afastado das tricas politicas que típicas desses
primeiros anos a seguir à ditadura. O programa ainda gerou um pequeno império
de spin-offs, com a publicação de 2 livros (antologias de piadas e sketches que
tinham ido para “o ar”) e uma revista brilhante, cheia de material
extra-programa, que embora eu não recorde a quantidade de números publicados,
penso que devem ter andado por volta dos 20, ...
O que interessa: era 1980, ... a rádio era o meio de
comunicação mais inovador e vanguardista da época, para isso bastando
dar uma pequena olhadela ao menu de
programas que então surgiram.
Musicalmente, desde finais dos anos 70 que a Rádio Comercial era “a”
estação a ouvir para quem era ainda jovem, mas não só.
Religiosamente, qual missa dominical, das 10 às 13 horas, não é
que o país parasse como para ver a Sónia Braga subir ao telhado de seu
Nacib um par de anos antes, mas pelo menos muitos de nós parávamos
para ouvir as vozes de Carlos Cruz e José Duarte, mais aquele do que este.
Pela qualidade incrivelmente consistente dos programas semanais
com três horas, quase sem qualquer ponto baixo, não há qualquer hipótese de
comparação, a não ser O Tal Canal, mas mesmo assim com alguma
margem de avanço para os amanteigados. Nos jornais havia então o aparecimento
do Miguel Esteves Cardoso (Música&Som, Se7e), que também
marcaria toda a década, mas nada é comparável ao Pão Comanteiga,
que me desculpem os incrédulos ou desconhecedores.
Em casa, já se sabia que o rádio a pilhas estava reservado todas
as manhãs de Domingo, mesmo que a família saísse para qualquer volta maior ou
menor. Não me lembro de nada comparável, que me tenha deslumbrado de forma tão
completa em matéria de comunicação social e de humor em português.
“Nem sempre o pecado mora ao lado; gasta-se um dinheirão em
transportes.”
“Cada vez há menos gente que tenha conhecido D. Afonso Henriques.”
“Quando a luxúria é cometida com uma grande limpeza, chama-se
lascívia.”
“Um peixinho vermelho, mergulhado em água a ferver, perde
rapidamente a cor.”
Nunca abotoe um botão de um elevador em andamento…
Há várias maneiras de um homem se abotoar. Por exemplo: com
milhares de contos!
Homem desabotoado vale por dois!
-Tem-se abotoado bem, ele… ah...!?
-Pois: abotoou-se e depois habituou-se…
Os Hunos foram os primeiros a considerarem-se hunos e indivisíveis. Indivisíveis porque eram primos.
As receitas dos médicos são as despesas dos doentes.
Um semideus é deus da cintura para cima ou da cintura para baixo?
Um domingo nunca vem só: traz a semana inteira.
As pilhas podem dar à luz: pilha és, mãe serás!
Até o tempo mal empregado se desconta para a Caixa!
Penso, logo rápido.
Uma carta de apresentação apresenta-se bem e o defeito que tem é ser tão usada.
Uma mulher fartava-se de lhe dizer:
- Não te Descartes marido, não te Descartes…
Ficou célebre como filósofo e matemático do século XVII…
Um carteiro quando faz batota, mete as cartas do 1º. esquerdo no 4º. frente.
Quando a família real joga às cartas todos estão proibidos de dizer: - Só me saem duques!
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